Isabel Braga da Cruz: “Há que perpetuar e fazer crescer a Católica no Porto.”

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O Porto é a sua casa, mas assume que a experiência de viver e trabalhar na Suíça a marcou profundamente. Contactou com diferentes realidades e novas formas de fazer e de investigar. Engenheira de formação e com um percurso empresarial, assume a presidência da Católica no Porto em 2017, cargo que exerce como “uma missão acima de tudo”. Alumni de Biotecnologia, a Católica é a sua Alma Mater. Nesta entrevista fala-nos da sua infância, das suas influências, da curiosidade por questionar tudo o que a rodeia e do seu grande desafio atual.

O que é que a move?
O que realmente me move são projetos que deixem uma marca, com valor e com propósito. É minha ambição colaborar e contribuir para projetos estimulantes que tenham metas e objetivos concretos e, essencialmente, que envolvam equipas com capacidade de fazer acontecer e com as quais eu possa aprender. Eu aprendo com toda a gente. Tenho aprendido sempre ao longo da minha vida e é isto que me faz abraçar esta missão, a certeza de que a Católica tem imensas possibilidades e de que aqui podemos fazer diferente, mais e melhor. Esta é a minha ambição e estou inteiramente focada nela.

 

Em 2017 assumiu o desafio de ser Presidente da Universidade Católica Portuguesa no Porto. Como encara esse desafio?
Acima de tudo é uma missão. Quando eu recebi o convite para este lugar senti uma responsabilidade muito grande em manter um legado, o nome Católica e um percurso para o qual já tantos contribuíram. Enquanto Presidente e agora, também, Pró-reitora, tenho a obrigação de o manter e o fazer crescer de forma sustentável. É uma missão sempre comprometida, na medida em que estou a lidar com pessoas, com um projeto de grande dimensão, com uma integração na região e com uma história. Há que perpetuar e fazer crescer a Católica no Porto.

 

Preside a um campus com 7 unidades académicas e 7 centros de investigação de áreas muito distintas. De que forma é que a junção num só campus de várias áreas do conhecimento é uma vantagem?
A grande decisão de fazer coligir todas as Unidades Académicas aqui do Porto num só campus foi muito com o propósito de termos aqui uma oportunidade única e que constitui um aspeto diferenciador da Católica face a outras universidades. No mesmo campus temos várias áreas do conhecimento e é nas interfaces que conseguimos explorar e encontrar oportunidades e potenciar esta diversidade. Aqui, na Católica no Porto, um estudante de biotecnologia pode ir de manhã a um concerto das Artes e à tarde a uma tertúlia em Teologia.  Há uma série de oportunidades e sinergias que a proximidade permite potenciar e isto é um estímulo enorme e é uma grande mais-valia que deve continuar a ser explorada.

 

Ser, também, uma alumni da Católica contribui para o seu papel enquanto Presidente da Católica no Porto?
O facto de ter estudado aqui faz com que eu sinta o nome Católica de outra forma. É a nossa alma mater, não é? Se fizer uma retrospetiva, vejo uma experiência, enquanto aluna, de todo o ecossistema da Católica. Tenho a experiência da cultura da casa, há um conhecimento dos professores e de toda a componente humana que aqui é tão querida e verdadeiramente sentida.

 

“Nós temos uma vantagem muito grande: não somos excessivamente grandes, mas, também, não somos pequenos.”

 

Temos de falar da proximidade, algo que tão bem caracteriza a Católica. Como é que se continua a conseguir proporcionar uma proximidade grande entre os estudantes e os professores?
Isso é o pulsar da Católica. Nós temos uma vantagem muito grande: não somos excessivamente grandes, mas, também, não somos pequenos. A Católica no Porto tem a dimensão ideal que lhe permite explorar essa proximidade e essa interação muito pessoal. Este formato tem trazido um grande retorno, os alunos valorizam essa proximidade e proporciona-se uma relação continuada que acaba por trazer frutos. Para além disto, a Católica no Porto também não se esquece que vive integrada numa cidade e numa comunidade. Esta proximidade que tão bem nos caracteriza não se limita a atuar dentro do campus. A nossa proximidade também tem reflexo lá fora. Há uma relação bilateral entre a Católica e a cidade e a região. São exemplo disso a relação que promovemos com diversas entidades da sociedade civil e com a Igreja, com as quais colaboramos. É nesta interação com o exterior que conseguimos passar os nossos valores e concretizar a nossa missão de relação, de proximidade e de responsabilidade social.

 

Nasceu em Coimbra, no seio de uma família numerosa, mas viveu praticamente toda a sua vida no Porto. É aqui que se sente em casa?
Sem dúvida, é no Porto que me sinto em casa. É verdade que nasci em Coimbra, mas só nasci lá porque os meus avós eram de lá. Nunca vivi em Coimbra, só vivi no Porto e em Lausanne, na Suíça.
Foi no Porto que cresci, que estudei até concluir a minha licenciatura na Católica. É nesta região que tenho desenvolvido grande parte da minha atividade profissional e onde vivo atualmente com a minha família. O Porto é uma cidade especial, aberta ao mundo e que sabe acolher muito bem.

 

Quais são as suas principais memórias de infância?
Eu sou a segunda de cinco irmãos. Venho uma família bastante numerosa, tanto do lado do meu pai, como do da minha mãe. Estou habituada a casas com muita gente e com muito barulho.
Tenho recordações de infância muito boas e muito bonitas, em particular dos verões passados em casa dos meus avós, os Natais muito preenchidos e, acima de tudo, sempre com muito calor humano. O que também marcou a minha infância foi o facto de, apesar de ter crescido no Porto, ter tido a oportunidade de passar muitos fins de semana em ambiente rural com os meus pais e meus irmãos. No fundo, acabei por conseguir ter a sorte desta dualidade de experiências que muito me marcou e ensinou.  Para além disso, para quem vem de famílias numerosas sabe bem que são sempre ambientes muito agitados e muito pouco apáticos, onde há sempre que lutar por um espaço e por uma voz. Eu sempre fui bastante curiosa e sempre gostei muito desta interação com a natureza. Por influência do meu pai, por ser engenheiro, aprendi a questionar tudo o que via à minha volta. Acho que este olhar atento que me foi transmitido, ainda que muito naturalmente, acabou por me oferecer um estímulo constante que me ensinou a olhar para a vida de uma forma diferente, questionando-a e procurando compreendê-la.

 

Durante a sua infância quem é que a desafiava a sair da zona de conforto?
O meu pai e a minha mãe. Ensinaram-me que o caminho é em frente. Desafiavam-me a ultrapassar barreiras e inseguranças. Ensinaram-me a seguir em frente e a não perder o foco com minudências.

 

Há alguma figura internacional ou nacional que seja uma referência para si tanto ao nível profissional como pessoal?
Eu sempre tive a sorte de trabalhar com pessoas que me estimulavam. Uma pessoa que impactou verdadeiramente a minha vida profissional, e também pessoal, foi o meu orientador de doutoramento que tive na Suíça, na Nestlé. Era uma figura muito particular: canadiano de origem escocesa, budista, sempre vestido de vermelho, marinheiro, porque vivia num barco, e físico de formação. Foi uma pessoa que teve muito impacto na minha vida porque, para além da forte componente humana, não tinha limites de pensamento. Também trago sempre referências pessoais e familiares que me inspiram e neste caso refiro o meu pai, enquanto exemplo de rigor, princípios, de trabalho e de qualidade.

 

Fale-nos um pouco sobre o Doutoramento em Biotecnologia pela Escola Superior de Biotecnologia em colaboração com a Nestlé, Nestlé Research Centre, em Lausanne, na Suíça. Estava nos seus planos?
De facto, o doutoramento não estava nos meus planos. A Católica, no âmbito do meu estágio de fim de curso, proporcionou-me um ambiente internacional numa multinacional, na Nestlé. Foi uma oportunidade excelente e que moldou a minha vida. O facto dessa primeira experiência ter sido bem-sucedida, levou a outras oportunidades. Seguiu-se um primeiro contrato de trabalho e mais tarde a proposta de financiamento para o meu programa de doutoramento, suportado pela empresa. Foi este contexto que me permitiu pensar na possibilidade de fazer um doutoramento em contexto empresarial, num ambiente internacional, que permitia desenvolver ciência com potencial de aplicação pratica, foi isso que me atraiu verdadeiramente. Foi a investigação com um propósito.

 

“O grande desafio da sociedade de hoje é o da humanização. Olhar para o outro e cuidar do outro.”

 

De que forma é que acha que está na Educação a solução para a minimização das desigualdades sociais?
A educação e a cultura são as vias para combatermos qualquer tipo de preconceito. Não tenho dúvidas de que quanto mais instruídos e mais educados formos, melhor podemos contribuir para minimizar as desigualdades da sociedade. Este é o caminho, sempre alicerçado no conhecimento e na educação. Quanto mais acesso ao conhecimento e quanto mais refletirmos sobre o tema e o discutirmos, mais facilmente seremos capazes de atuar no sentido da igualdade das oportunidades.

 

Em tempos de pandemia, como é que sente a geração mais jovem?
Estamos a passar uma experiência totalmente nova que tem consequências em todas as gerações. Uma das que tenho sentido nos mais jovens é algum desânimo. É importante que se contrarie esta apatia incentivando e promovendo nos mais jovens, e não só claro, a importância do pensamento crítico e, também, a importância de se saber valorizar cada momento. Arriscar, sair da zona de conforto e empenhar energia ao serviço do mundo e do outro. O sabermos colocar tudo em cada pequena coisa, seja num jantar de família, seja numa aula ou num simples momento, é parte essencial do caminho que dá resposta ao desafio da humanização.

 

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06-01-2022