Luís Pina Rebelo: “Para se ser um empreendedor é preciso mais do que uma boa ideia.”

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Luís Pina Rebelo é docente da Católica Porto Business School. É licenciado em Gestão pela Universidade Católica e doutorado em Economia pela Faculdade de Economia do Porto, com especialização em Economia e Gestão da Saúde. A Gestão Estratégica e o Empreendedorismo são também duas áreas a que se tem dedicado. Coordena a Pós-Graduação em Empreendedorismo e Business Development e integra o Conselho Fiscal da Associação Nacional de Jovens Empresários. Viagem de sonho? Japão. O que é que o move? “A curiosidade inata por tudo.”

 

Como é que se ensina o Empreendedorismo?

É muito difícil desenvolver interesse pelo Empreendedorismo, ou melhor, o interesse até pode existir, mas é difícil desenvolver empreendedores e em concreto é muito difícil e muito desafiante em Portugal, porque tradicionalmente temos das taxas mais baixas de empreendedorismo, ainda que isso pareça estar a mudar. Historicamente, somos um país reconhecido por ter uma elevada aversão à incerteza, por exemplo. E eu gostaria de contribuir para mudar isso.

 

É licenciado em Gestão e Administração de Empresas pela Universidade Católica no Porto. Porquê escolher esta área?

Já pensava em Gestão na adolescência, se calhar pelo motivo errado. Acho que quase toda a gente começa a pensar na Gestão pelo motivo errado. Começa a pensar que talvez gostasse de mandar e de ter algum comando sobre as coisas. Ora aqui está um grande erro. Mais tarde é que comecei a encarar a Gestão de forma mais séria, quando, justamente, me deparei com uma vontade de fazer muitas coisas diferentes. Tinha alguma dificuldade em escolher, porque gostava de coisas tão díspares como a Matemática, a Física, as Artes e a Psicologia. Sempre fui um curioso pelo comportamento humano. Também ponderei o Direito, porque tinha boa capacidade de argumentação. Enfim, tudo isto me levou à Gestão, porque percebi que um bom gestor, principalmente na Estratégia e no Empreendedorismo, tem de fazer usar de áreas de conhecimento muito diferentes.

 

É importante dominar várias áreas? Ser-se multitasking?

Precisamente. Ou pelo menos sermos uns constantes curiosos acerca do que nos rodeia. É fundamental. Quando falamos de alguém que trabalha em empreendedorismo temos de pensar em alguém que seja inovador, domine a vertente mais comercial, que compreenda o comportamento do consumidor, que saiba identificar oportunidades e necessidades, mas que também saiba ler os números, que consiga extrair das pessoas o melhor delas, entre outras características. Olho para as pessoas que têm estes perfis muito diversificados e recordo-me do Homem do Renascimento.

 

Como Leonardo da Vinci?

Sim, ele sabia um bocadinho de tudo. Era, de facto, brilhante. Infelizmente para mim, a ideia de Homem do Renascimento é algo que não é muito estimulado hoje em dia, porque a atualidade tende para a especialização. Mas esta visão é algo que me inspira e encontrei no empreendedorismo esta possibilidade de trabalhar em áreas diferentes e de me realizar em dimensões variadas.

 

O que é que mais o marcou durante os seus anos de aluno na Católica?

O meu percurso na Católica ficou muito marcado por uma forte vivência académica. Festas académicas, um estágio de verão em Nova Iorque, fiz parte da fundação da CAtólica SOlidária, o núcleo de voluntariado da Universidade Católica no Porto. O associativismo permitiu-me desde cedo fazer aquilo que eu mais gostava: criar projetos de raiz, mobilizar pessoas, ajudar a perceber qual a melhor forma de fazer uma ideia crescer. Foram anos muito bons.

 

Para além da especialização na área da Gestão Estratégica e do Empreendedorismo, também se vem a especializar na área da Gestão de Saúde…

Doutorei-me em Economia e Gestão de Saúde, precisamente. Motivado pelas minhas experiências de voluntariado. Fiz voluntariado em Angola com crianças e foi uma experiência que me tocou muitíssimo. Fiz voluntariado num hospital que, como se pode imaginar, não tinha praticamente condições ou pelo menos saía totalmente fora daquilo que é a nossa realidade. Deparei-me com uma desorganização total do hospital de lá e com uma total falta de recursos. Foi a partir daí que me comecei a interessar pela organização do nosso sistema de saúde e no fundo pela sustentabilidade do nosso próprio SNS, que, de facto, carece muito de gestão.

 

A Saúde em Portugal tem estado permanentemente na agenda. Não pelos bons motivos…

A Saúde em Portugal, não a privada, porque a privada até tem feito, de facto, desenvolvimentos muito fortes, está muito mal, em termos de gestão. A sustentabilidade do SNS, que visa ser universal e tendencialmente gratuito, já está em causa há muito tempo. É preciso haver algum tipo de resposta para este problema, porque há uma insatisfação generalizada, quer dos pacientes, quer dos profissionais de saúde. Esta insatisfação coincide com uma altura em que, finalmente, foi feita uma coisa que eu próprio já advogava nas minhas aulas. Eu perguntava sempre “Quem é o gestor estratégico do SNS?” e não havia resposta. Como é que um sistema desta dimensão, que é consumidor de recursos em massa, não tem nenhuma entidade gestora a dirigir, estrategicamente, o sistema? Assisti, por isso, com agrado à criação dum órgão de Direção Executiva do SNS (independentemente de quem concretamente é nomeado), no entanto continuamos a assistir a um impasse grande relativamente àquele que será o seu papel e o âmbito da sua atuação. Urge conferir gestão e, nomeadamente, gestão estratégica ao SNS.

 

Essa Gestão que refere não tem de passar obrigatoriamente pelo corte de custos pela via da diminuição de salários dos profissionais?

Não tem obrigatoriamente. A pandemia colocou a nu muitas fragilidades. Durante essa altura, os médicos estiveram de parabéns porque conseguiram ultrapassar uma série de dificuldades. Recordo-me que foi notícia o facto de os médicos terem criado um grupo de Whatsapp para cruzarem disponibilidades hospitalares. Ainda bem que arranjaram esta forma de contornar o problema, mas, ao mesmo tempo, faz-nos perceber que existe uma falta de gestão muito grande. Como é que não há mecanismos instituídos para fazer esse cruzamento de informação? Temos regiões com duplicação (ou triplicação) de serviços e outras em que certos serviços estão deficitários. É preciso fazer um cruzamento da capacidade instalada, é preciso reafetar recursos, gerir melhor alguns deles, compreender o que se pode fazer em termos de logística e de stocks para não haver desperdícios etc. Todas estas questões têm uma solução na Gestão e a solução não tem de passar necessariamente por cortes nos custos e nos salários. Bem pelo contrário, porque fazendo uma correta racionalização, podem libertar-se fundos valiosos para se poder pensar, verdadeiramente, em melhores condições de trabalho para os profissionais de saúde. A solução para o problema está na gestão.

 

Atualmente, coordena a pós-graduação em Empreendedorismo e Business Development da Católica Porto Business School.

É uma formação que existe precisamente para estimular e apoiar o empreendedorismo. É uma formação em parceria com a Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE), da qual faço parte do Conselho Fiscal. Eu próprio tentei ser empreendedor quando desenhei o programa deste curso. É um curso que leva à ação! Quisemos ser out of the box para podermos apresentar um programa multidisciplinar de formação muito completo que pretende entregar aos alunos dois outputs muito concretos. Um deles é o apoio concreto para que no final tenham apresentado o seu projeto a uma candidatura a fundos ou financiamento e o outro é que saiam do curso com um plano de negócios pensado e desenhado de fio a pavio. É uma pós-graduação não só dirigida a novos negócios, mas também a negócios já existentes que precisem de um novo caminho, ou até projetos novos em contexto de empresas já estabelecidas.

 

O que é que mais gosta em ser professor?

A possibilidade de aprender, acima de tudo. Os alunos desafiam-me imenso e obrigam-me a ir estudar e investigar temas diferentes. À medida que cresço, cada vez a distância, em idade, dos meus alunos é maior e, por isso, estou sempre a aprender com eles e em contacto com as novas gerações e com as novas formas de pensar. Eles expõem-me permanentemente à atualidade.

 

O que é que distingue a Católica?

É precisamente aquilo que já distinguia a Católica quando há 20 anos entrei para a licenciatura. A Católica tem uma reputação muito presente no mercado. Foi pioneira na área da Gestão e tem uma experiência e um conhecimento muito consolidados que a faz ter a capacidade de potenciar e elevar o talento dos alunos e fazê-los capazes de serem a diferença na sociedade. A Católica estimula a multidisciplinaridade, as competências transversais, a criatividade e a ligação às empresas e organizações. Dou a disciplina de plano de negócios para os alunos finalistas da licenciatura em Gestão, que é das coisas que mais me preenche, e é um excelente exemplo de como a Católica proporciona aos seus alunos oportunidades de desenvolvimento integral e de descoberta.

 

O que diria a um jovem que quer empreender?

Para se ser um empreendedor é preciso mais do que uma boa ideia. É preciso ter a capacidade para viabilizar e implementar. O melhor conselho que posso dar aos jovens que querem empreender é que apostem na formação e no conhecimento. O conhecimento valioso. A formação é indispensável para dar forma concreta a um projeto.

 

Alguém que gosta de aprender áreas muito diferentes, também deve estar sempre a descobrir coisas novas para os tempos livres…

Sim (risos). Recentemente ando a descobrir uma paixão pela jardinagem aos fins de semana. Tento sempre aplicar a minha vertente mais criativa. Entre outras coisas que adoro fazer, sou pai. A paternidade não se pode considerar um hobbie, mas, de verdade, que tiro muito prazer disto. Sempre tive muito interesse em compreender o ser humano e perceber o que é inato, o que é que é desenvolvido, o que é que é genético. O que é que nos faz ser como somos? É um privilégio poder assistir e fazer parte do crescimento das minhas filhas.

 

Também gosta de viajar. Uma viagem que esteja nos seus planos?

Gostava muito de ir ao Japão. É uma cultura diametralmente oposta à nossa e tenho uma grande urgência em conhecer melhor.

 

O que é que o move?

Move-me esta curiosidade inata por tudo e a vontade de fazer a diferença e de poder contribuir para o desenvolvimento de alguma coisa. É isto que me realiza.

 

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18-01-2024