Francisca Guedes de Oliveira: "Sete anos escravo!"

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Francisca Guedes de Oliveira: "Sete anos escravo!"
Sexta-feira, 16 de Abril de 2021 in Jornal Económico Online (O)

Não sou jurista e, consequentemente, não tenho soluções concretas. Mas sei que o atual sistema não funciona. Não funciona no garante de direitos dos inocentes e não funciona na célere condenação dos culpados.

O sistema judicial é o garante máximo do estado de direito e da democracia de um país. É ele que assegura que todos têm os seus direitos garantidos, se sentem protegidos e podem reclamar quando atacados. Deve proteger fracos contra fortes e fortes contra fortes de igual forma. Não descrimina e deve dar-nos uma sensação de segurança perante a lei. Este não é o nosso sistema!

Para começar, a sensação comum de que os ricos estão sempre mais protegidos é efetivamente verdadeira. E é-o não porque as decisões sejam voluntariamente enviesadas ou a lei proteja os ricos, mas porque não só os advogados não têm todos a mesma capacidade, peso e custo mas porque, globalmente, o custo de uma qualquer ação ou processo é tal, que a maioria das pessoas não o pode sequer considerar, especialmente quando não pode ter a expectativa de, em tempo útil, vir a ter uma decisão.

Em segundo lugar, a sensação de que se, por algum motivo, formos enrolados num processo de quase qualquer natureza, sendo ou não inocentes, entramos num ambiente kafkiano. Olhemos para a Operação Marquês. Sem qualquer juízo de valor acerca da culpabilidade dos arguidos, o que se passou é um atentado aos direitos mais básicos de qualquer cidadão. Estiveram sete anos envolvidos num conjunto de acusações gravíssimas, sem ir a julgamento, mas com a vida destruída, desfeita. No caso de José Sócrates com a agravante de ter passado um desses sete anos preso. Sem acusação formada!

Admita-se agora, em tese, que ele é inocente: isto é um pesadelo, um verdadeiro terror. E sim, mesmo José Sócrates tem direito à presunção de inocência até ser dado como culpado num julgamento. Dir-me-ão que havia indícios fortes, que a investigação era necessária.

Certo, por vezes, mesmo com a presunção de inocência, as pessoas são alvo de investigação. Mas sete anos escravo de uma situação tremenda? Admita-se agora que ele é culpado: então já devia estar julgado e condenado há muito. Devia ter sido levado a tribunal e estar já a pagar pelos crimes cometidos para não ficarmos todos com a sensação de que a justiça permite um grau grande de impunidade a corruptos e poderosos.

Dir-me-ão, mas é um megaprocesso, complexo, com milhares de provas e detalhes. Então simplifique-se, encontrem-se formas de separar as várias acusações em processos manejáveis, garanta-se agilidade e rapidez. Não sou jurista e, consequentemente, não tenho soluções concretas.

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