Ricardo Costa: “Não existem empresas extraordinárias sem pessoas extraordinárias.”

Pessoas em Destaque

Ricardo Costa é presidente do Grupo Bernardo da Costa e autor do livro “A Felicidade é lucrativa”. Natural de Braga, fez o MBA da Católica Porto Business School, entre 2010 e 2012, experiência que descreve como um “grande desafio” e como uma oportunidade especialmente marcante pelas pessoas com quem se cruzou. Tem assumido os temas da felicidade no trabalho e da liderança humanizada como uma missão: “O que quero é que os empresários percebam que quanto mais investimos nas nossas pessoas, mais produtividade e mais rentabilidade temos.” Nesta entrevista, fala do desafio da requalificação motivado pelo desenvolvimento exponencial da inteligência artificial e confessa-se, também, um “defensor acérrimo da criação da Área Metropolitana do Minho”.

 

É Presidente do Grupo Bernardo da Costa. Que dimensão tem, atualmente, o grupo?

Somos um grupo que nasceu em 1957 e que hoje conta com 11 empresas em áreas muito diversas. A principal é a segurança eletrónica com presença em Portugal, Espanha, Brasil e Marrocos. Depois temos empresas em diferentes áreas como as casas inteligentes, áudio e vídeo profissional, Marketplace, a formação, consultoria, intermediação de crédito e literacia financeira... empregamos cerca de 380 pessoas e, em 2024, tivemos um volume de negócios superioe a 82 milhões de euros.

 

Quais são as suas principais referências?

A minha família. O meu avô, o meu pai e o meu tio, que conduziram o Grupo Bernardo da Costa, na altura ainda era só empresa, sempre tiveram uma cultura de valorização das pessoas. Sempre quiseram que os colaboradores se sentissem parte da família. Valores como o respeito, a solidariedade, a partilha, a segurança, a confiança e a cooperação já são praticados há 68 anos.

 

Qual é o maior desafio da posição que ocupa?

Ter as pessoas certas nos lugares certos, no momento certo. É isso que faço todos os dias. Procurar essas pessoas, motivá-las individualmente e em equipa. Este é o meu maior desafio. E, claro, contribuir com uma estratégia que permita antecipar tendências. Se não for possível antecipar, pelo menos não ficar atrás. Mas o segredo está mesmo em antecipar.

 

É autor do livro “A Felicidade é Lucrativa” e um dos conceitos centrais do livro é a liderança humanizada. De que forma é que o Grupo Bernardo da Costa aplica este conceito?

Aí está um tema onde conseguimos antecipar uma tendência. Porque nós não falamos de liderança humanizada em 2025, mas já há muitos anos. Em 2017, criámos o nosso Departamento da Felicidade que foi o primeiro em Portugal. Temos colhido os frutos de termos antecipado esta tendência e necessidade, tanto ao nível da rotatividade como, acima de tudo, da nossa capacidade de atrair os melhores talentos. Porque não existem empresas extraordinárias sem pessoas extraordinárias.

 

Portugal está no bom caminho? Há cada vez mais pessoas a praticar uma liderança humanizada?

Acredito que há mais líderes a apostar nisto, até porque é incontornável. Ou as empresas adotam este caminho, ou acabam por perder as pessoas para outras geografias, que é o que infelizmente já acontece em larga escala. Precisamos do bom talento, aquele que as nossas universidades formam tão bem e a Católica é um excelente exemplo disso. Felizmente, está a fazer-se esse caminho. Cada vez há mais líderes a defender esta liderança empática e humanizada e eu estou convencido de que vai mesmo ser incontornável. O mercado vai encarregar-se de demonstrar que, a não ser que atuem em nichos muito específicos, em setores altamente rentáveis, as empresas vão precisar das melhores pessoas para competir. E para ter as melhores pessoas, é preciso tratá-las bem.

 

Que características considera imprescindíveis para uma liderança humanizada?

Coerência, consistência, bom senso e empatia. A inteligência emocional é fundamental. É preciso saber o que é realmente relevante, é preciso colocar-se no lugar do outro quando se analisa uma situação, um comportamento ou uma atitude.
É preciso, também, saber tolerar e até fomentar o erro. Não podemos mais criminalizar o erro. O erro faz parte do crescimento. Não há inovação nem disrupção sem erro. Claro que se for o mesmo erro duas ou três vezes, já não é erro, é uma decisão. O bom líder também tem de ser um facilitador, um agente da mudança. A mudança é o novo normal. Nunca como hoje aquela frase de Darwin foi tão importante – “Não é o mais forte nem o mais inteligente que sobrevive, mas o que melhor se adapta à mudança.” Ao mesmo tempo, é fundamental que o líder perceber o propósito das pessoas com quem trabalha e fomentar a criação de relações em contexto de trabalho, está mais que demonstrado que relações de amizade criadas em contexto profissional aumentam até sete vezes o comprometimento das pessoas com a organização. Acima de tudo, o líder tem de dar o exemplo, com empatia, com capacidade de inspirar e motivar.

 

Há uma expressão que sei que não gosta particularmente – “reter talento”. Porquê?

Não gosto e até me causa urticária. Já mudei cartazes de conferências por causa disso. Não podemos falar em retenção de talento, mas em atração de talento. Devemos atrair quem queremos contratar e continuar a atrair quem já está connosco. É como num casamento: a mulher não retém o marido ou o marido a mulher. Eles têm de se atrair constantemente para que nenhum queira desistir ou deixar a relação. Nas empresas é igual.

 

A questão da felicidade no trabalho já não é apenas um objetivo profissional, mas assume-a também como uma causa na sua vida …

Interessa-me verdadeiramente transformar a forma como se pensa o trabalho. A maioria das pessoas encara o trabalho como um sacrifício necessário para ganhar um ordenado e comprar coisas que supostamente trazem felicidade. Mas está mais do que provado que essa felicidade, baseada em bens materiais, é muito efémera. Passamos a maior parte do nosso tempo acordado a trabalhar e, por isso, se o trabalho não for um momento de felicidade, toda a nossa vida deixa de fazer sentido. É esta a minha causa. Acredito profundamente nisto. Não faz sentido que tanto tempo da nossa vida seja passado em ambientes tóxicos e infelizes. Por isso, o que quero é fazer com que os empresários percebam que quanto mais investimos nas nossas pessoas, mais produtividade e mais rentabilidade temos. Mas há também uma missão: proporcionar às pessoas que trabalham connosco um ambiente saudável, seguro, que respeite o bem-estar e o equilíbrio entre vida pessoal, profissional e familiar.

 

Em 2010, vem fazer o MBA à Católica Porto Business School. Qual foi a sua motivação?

Vim pelo desafio pessoal e porque, naturalmente, valorizo sempre a formação e a qualificação ao longo da vida. Portugal é o segundo pior país da OCDE nesse aspeto. Eu quero contrariar esta tendência e procuro, regularmente, fazer formação.

 

O que é que mais o marcou?

Sem dúvida, as pessoas que conheci: os colegas e os professores, muitos dos quais ainda mantenho contacto. A partilha com todas essas pessoas foi mesmo o mais importante e marcante. As semanas internacionais também foram muito importantes, tanto em São Paulo como em Barcelona. Foi uma experiência que valeu muito a pena e que me permitiu reforçar e consolidar conhecimentos que já tinha e adquirir muitos outros novos. Mas foi um grande desafio, porque o MBA era mesmo muito intenso, tínhamos aulas semanalmente e havia sempre muitos trabalhos e solicitações e, para além disso, também tínhamos de ter tempo para estudar as matérias e realizar os trabalhos.

 

Como é que olha para o desenvolvimento exponencial da tecnologia e da inteligência artificial?

O que a inteligência artificial e o desenvolvimento tecnológico não conseguem substituir são as pessoas e a partilha genuína das experiências. Olho para estes avanços tecnológicos como uma ótima oportunidade para nos requalificarmos e realizarmos tarefas cada vez mais produtivas e prazerosas. E deixar as tarefas mais aborrecidas para as máquinas.

 

Considera que, de alguma forma, a inteligência artificial pode contribuir positivamente para a felicidade no trabalho e para a realização profissional?

Acho que sim. No sentido em que permite que algumas funções, que são de facto muito monótonas, sejam automatizadas. Assim, essas pessoas poderão dedicar-se a algo mais prazeroso, que exija competências mais desenvolvidas e inatas. Mas isto traz-nos o grande desafio da requalificação. Basta ver o que dizem pessoas como o Bill Gates: entre 30% a 40% das funções atuais vão ser desempenhadas por inteligência artificial nos próximos 10 anos. Isto não significa que 30% a 40% das pessoas vão ficar sem trabalho, mas sim que essas pessoas terão de se requalificar para fazerem outras coisas.

 

Uma viagem especialmente marcante?

A Lapónia foi, sem dúvida, marcante. Já com mais de 40 anos voltei a sentir-me um menino, quase a acreditar no Pai Natal (risos). Toda a experiência com as renas, os huskies, a aldeia do Pai Natal, as auroras boreais… marcou-me muito.
Também gosto muito do Brasil. Temos negócios lá, por isso vou com alguma frequência. O Brasil conquista-me pelas pessoas, que nos fazem sentir em casa.

 

Apesar de viajar muito, sabe bem voltar a Braga …

Sabe muito bem-estar em Braga. Acabei de vir do Vietname, Laos e Camboja, viagem que gostei muito, mas entrar em casa, dormir na minha cama… não há nada que pague isso. Sou um defensor acérrimo de Braga e do Minho, e da criação de uma área metropolitana do Minho. Entre 2021 e 2024 fui presidente da Associação Empresarial do Minho. Hoje sou presidente do Conselho Geral. Em 2016, fui nomeado embaixador empresarial de Braga. A Associação foi a primeira a propor a ideia da criação de uma área metropolitana do Minho, agora adotada por vários candidatos às autárquicas. O antigo Ministro da Economia, António Costa e Silva, dizia que este polígono – composto por Braga, Guimarães, Famalicão, Barcelos e Viana - era o motor da economia nacional. E é verdade: pela capacidade industrial, pela inovação tecnológica, pelas indústrias têxteis, pela metalomecânica, pela construção civil e, também, pelas tecnologias da informação. Infelizmente, não recebemos do Governo central o mesmo que contribuímos para o país – em criação de riqueza, emprego e exportações. Está na hora dos autarcas da região se unirem para mostrar a força em conjunto. O problema é que cada um tem falado por si, com uma visão ainda muito minifundiária. Temos de perceber que juntos somos muito mais fortes e que a cooperação é fundamental.

 

pt
12-06-2025