André Guimarães: “A seleção de investimentos sustentáveis está a crescer.”

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André Guimarães é alumni da Católica Porto Business School e diretor executivo no Banco J. Safra Sarasin. O Banif e o Credit Suisse são duas instituições que marcam a sua carreira, a par, também, de uma experiência “muito enriquecedora” enquanto empresário e empreendedor. Aos 34, depois de licenciado pela Católica em Gestão, regressa à Universidade para o mestrado em Finanças - “Quis redirecionar a minha carreira para a área dos investimentos financeiros”. Natural de Santo Tirso, já viveu em França, na Suíça e, atualmente, em Inglaterra, Londres. Nesta entrevista falamos, entre outras coisas, de Sustentabilidade e Inteligência Artificial na Banca de Investimento.

 

Vive há muitos anos fora de Portugal. A vontade de trabalhar no estrangeiro começou quando?

Desde muito cedo, durante a adolescência. Tive a sorte de viajar bastante com a minha família, o que despertou em mim a curiosidade pelo resto do mundo e pelas oportunidades que podia encontrar lá fora. A ideia de viver e trabalhar fora foi-se consolidando com o tempo e esteve sempre nos meus desejos.

 

Quando é que surge a ideia de estudar Gestão?

A ideia de seguir Gestão começou a formar-se durante a minha adolescência. A minha família esteve sempre ligada à gestão de empresas, o que acabou por influenciar as minhas escolhas. Com 16 anos, comecei a pensar mais a sério no que queria seguir e tive várias conversas com o meu pai, que me incentivava a escolher Economia na Faculdade de Economia do Porto. Contudo, era a Gestão que me entusiasmava. Nunca tive medo de desafios e sempre me cativou o diferente e o inovador. Em 1989, entro para o ano zero do curso de Gestão na Universidade Católica no Porto.

 

Que memórias guarda dos anos na Católica?

O curso de Gestão na Católica foi uma experiência muito enriquecedora, foram anos de um grande desenvolvimento intelectual e pessoal. Guardo memórias muito boas. Gostei muito do curso que, embora generalista, incluía disciplinas desde a Gestão de Investimentos, Investigação Operacional ou disciplinas relacionadas com fiscalidade ou directo comercial. A diferença face ao curso de Economia é que enquanto a Economia se foca no cenário mais macro, a Gestão concentra-se na microeconomia e no funcionamento das empresas. Ao longo do curso, percebi que estava no caminho certo. Além disso, o meu interesse pelas áreas das finanças e da banca foi crescendo. Sempre gostei muito de matemática e, aos 18 anos, já investia na bolsa. No terceiro e quarto ano, percebi que o meu futuro poderia passar pela consultoria ou pela banca de investimento. Foram anos de grande descoberta e desafio.

 

Como é que fica marcado o início da sua carreira?

Antes de terminar o curso, o Professor Mário João Coutinho dos Santos sugeriu o meu nome para uma vaga no Banif. Embora estivesse mais inclinado para a consultoria, aceitei a oportunidade. Digamos que este foi o início do desvio da minha carreira (risos). Com 22 anos, comecei a trabalhar no Banif, inicialmente a assessorar um diretor no desenvolvimento de novas agências no Norte de Portugal. Foi uma experiência muito enriquecedora. Foi no Banif que também tive a oportunidade de ter uma visão transversal e muito completa sobre a organização de um banco. Foi uma excelente escola, embora tivesse sido aqui que percebi que a banca de retalho não seria bem o meu caminho e que talvez gostasse de ir experimentar outras coisas. Aos 27 saí do banco e comecei a trabalhar por conta própria e a ser empreendedor.

 

“O curso de Gestão na Católica foi uma experiência muito enriquecedora, foram anos de um grande desenvolvimento intelectual e pessoal.”

 

O que o motivou a tomar essa decisão?

A vontade de enfrentar novos desafios e de inovar foi o que me moveu. Comecei uma empresa nova. A tradição familiar ligada aos negócios influenciou-me e sempre quis explorar novas ideias. Foi nesta altura que fiz a minha primeira saída de Portugal em trabalho e fui viver para Paris. Passei de um formato de estar a trabalhar numa instituição financeira estável para um formato completamente diferente, onde era empreendedor, onde cada dia tinha de fazer tudo. Cada dia era bastante diferente! Era grande o entusiasmo de, através de uma ideia, criar um negócio e desenvolver as operações necessárias para pôr a empresa a crescer. Foi uma experiência extraordinária. Mais tarde, decido sair da empresa e sou convidado para ter uma experiência numa empresa industrial, onde estive quatro anos. Passei pelas diferentes secções da empresa, primeiro como responsável da área comercial para um determinado grupo de clientes e depois, numa segunda fase, estive como responsável de compras da empresa.

 

Até que volta o apelo pela área dos investimentos …

Sim, na verdade o gosto pela área dos investimentos financeiros esteve sempre lá. Desde a faculdade. Mas é nesta minha experiência na indústria que comecei a pensar em redirecionar a minha carreira. Tinha eu 34 anos.

 

Foi um processo difícil?

Não foi fácil. Eu já estava afastado da área financeira há algum tempo. Percebi que era importante voltar a estudar. Percebi, também, que a gestão de patrimónios poderia ser uma possibilidade. Voltei à Universidade Católica para fazer um mestrado em Finanças e comecei a trabalhar numa gestora de investimentos independente. Depois destes dois anos a estudar e a adquirir experiência, surgiu a oportunidade de integrar o Credit Suisse, em Zurique e Genebra. Passados cerca de 5 anos sou convidado para chefiar a equipa Ibérica do Wealth Management em Londres. No total estive 13 anos no Credit Suisse, uma instituição de bastante prestígio na altura.

 

É uma vida que implica alguns sacrifícios pessoais?

Claro. Do ponto de vista pessoal, isto tem algumas, muitas aliás, implicações. A maioria das pessoas nem sequer imagina. Embora numa posição privilegiada, mas, na verdade, revejo-me também no papel do emigrante. Ao fim de dois anos no Credit Suisse, a minha família juntou-se a mim. Quando sou convidado a ir para Londres, foi necessário tomar novamente a decisão e envolver novamente toda a família nesta mudança. São sempre decisões difíceis de tomar.

 

“No Safra Sarasin temos uma equipa enorme a fazer a seleção de investimentos sustentáveis.”

 

De que forma aconselha as gerações mais novas a procurarem mais formação?

É absolutamente fundamental. Tem sido uma prioridade na minha carreira. Estamos numa era em que a digitalização dos serviços financeiros está a transformar o setor. É crucial investir em formação contínua e adquirir competências que nos diferenciem. Em muitos setores, há uma verdadeira rutura com o convencional e acompanhar estas mudanças é essencial para o sucesso. É muito importante perceber-se o que está a acontecer em termos de transição nos setores em específico em que as pessoas estão inseridas. Aconselho a que se procure formação específica e direcionada a determinados temas e desafios, em vez de se fazer uma espécie de atualização convencional. Hoje em dia tudo muda muito rapidamente. Temos de acompanhar e de estar à frente dos problemas.

 

Atualmente trabalha no banco J. Safra Sarasin. O que é que mais o desafia?

Actualmente sou responsável por uma equipa que gere patrimónios de clientes localizados em diversas partes do mundo. Um dos grandes desafíos é ter a perceção da cultura desses países e adaptar os procedimentos internos a cada uma dessas regiões na Gestão de Investimentos. Por exemplo, desde a saída do Reino Unido da União Europeia a prestação de serviços financeiros passou a ter um regime diferente uma vez que deixou de ter livre acesso ao mercado único que facilitava o aconselhamento de investimentos financeiros em qualquer país do espaço europeu. O Banco J. Safra Sarasin é um Banco global com escritórios em 27 países, desde Hong-Kong e Singapura, como em vários países do Médio Oriente e principais cidades da Europa. O grupo Safra tem ainda o Banco Safra no Brasil com sede em S. Paulo e o Safra National Bank of New York com sede em Nova Iorque.

 

Londres continua a ser um dos financeiros mais importantes do mundo?

É um centro financeiro de excelência. Apesar de ter havido um movimento com o Brexit e alguns serviços terem ido para algumas cidades europeias, a verdade é que Londres continua a ter um papel central. Desde logo, porque a lei inglesa é muito sólida e célere. A indústria do private equity e a indústria dos hedge funds estão em ascensão. Têm tido crescimentos exponenciais e vão continuar a ter, porque Londres conseguiu segurar todo esse ecossistema. Na área de serviços financeiros digitais fintech, Londres tem sido o grande impulsionador na criação de novos conceitos. Os investimentos dos grandes bancos americanos continuam a manter aqui uma presença forte. Li um artigo recentemente que dizia que Londres recuperou em relação a Nova Iorque. Desde o Brexit que tinha perdido o estatuto de ser o centro financeiro número 1 do mundo. Entretanto recuperou e está praticamente ao mesmo nível de Nova Iorque outra vez.

 

“Haverá dificuldades e desafios, mas acredito que a mudança é essencial para o progresso.”

 

A Sustentabilidade no setor financeiro é uma prioridade?

Sim, e cada vez mais. A sustentabilidade no setor bancário tem duas vertentes: a própria sustentabilidade das instituições financeiras e a sustentabilidade dos investimentos. Muitos bancos têm adotado práticas mais ecológicas e a seleção de investimentos sustentáveis está a crescer. No Banco Safra Sarasin, por exemplo, começámos há mais de 30 anos a criar portfólios sustentáveis. Temos fundos de investimento totalmente sustentáveis em diversas áreas. A tendência é aumentar cada vez mais. No Safra Sarasin temos uma equipa enorme a fazer a seleção de investimentos sustentáveis. Estamos extremamente bem preparados.

 

A IA é um dos grandes desafios da banca?

Estamos no início de uma disrupção sobre a qual tenho dificuldade neste momento em ter uma imagem clara, embora tenhamos cada vez mais pistas de como as coisas vão acontecer. A Inteligência Artificial é, sem dúvida, um dos grandes desafios da banca e estamos a assistir a uma verdadeira revolução tecnológica. Estamos numa fase de transição na área da gestão de investimentos. Uma área em que não sabemos se, um dia, a inteligência artificial vai ou não substituir os gestores de portfólios de investimentos. Existem poucos gestores no mundo que consigam estar consecutivamente acima das performances dos índices de mercado. Já começamos a ver fundos quânticos que utilizam inteligência artificial. O nível de eficiência de gestão pode vir a ser superior à que o Homem pode fazer. Estamos numa fase de transformação e também de revisão dos custos associados a isso.

 

Assusta-o ou entusiasma-o esta transformação?

Sou naturalmente otimista, por isso estas mudanças entusiasmam-me, embora saiba que haverá sempre danos colaterais. Haverá dificuldades e desafios, mas acredito que a mudança é essencial para o progresso.

 

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21-11-2024