"Misericórdia"

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"Misericórdia"
Quinta-feira, 2 de Maio de 2024 in Dinheiro Vivo online

Artigo de Opinião por Alberto Castro, docente da CPBS.
Os problemas envolvendo a chamada Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML), culminados no despedimento da sua administração, são um bom exemplo dos equívocos que, não poucas vezes, rodeiam as nomeações dos gestores de entidades estatais, de natureza empresarial (e, por vezes, mesmo nas de natureza não empresarial). Com frequência, os critérios de alinhamento partidário prevalecem sobre os de competência, não sendo de estranhar que sobrevenham maus resultados, potenciados por (outras) decisões políticas (e de políticas) desasadas.
A SCML é, contudo, um caso peculiar. Não me refiro à designação enganosa (em rigor, não se trata de uma “misericórdia”), mas ao facto de ser um veículo de política social, financiado pelas receitas dos jogos de sorte e azar de que, até há uns anos, a SCML era monopolista. Nem sequer ao paradoxo de esse monopólio pôr o país, como um todo, a financiar atividades maioritariamente desenvolvidas na região de Lisboa. Tenho em mente, sim, o facto de, em Portugal, como sucessivos estudos foram demonstrando, uma parte significativa dos compradores dos vários jogos promovidos pela SCML coincidir com o destinatário típico das ditas políticas sociais. O cínico diria que a SCML vai gerando e alimentando a sua própria clientela. Uma contradição que torna a gestão de uma entidade com esta natureza particularmente delicada e exigente, pouco compatível com equipas sujeitas a escolhas e ciclos políticos.

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