“O Estado-Regulador em Portugal: Evolução e Desempenho”, estudo da FFMS, coordenado por docente da Católica Porto Business School

“O Estado-Regulador em Portugal: Evolução e Desempenho”, o novo estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS), que analisa a independência das entidades reguladoras em Portugal e o impacto da criação do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, foi coordenado por Ana Lourenço, docente da Católica Porto Business School (CPBS). O estudo, realizado no âmbito do Centro de Estudos de Gestão e Economia Aplicada (CEGEA), contou ainda com colaboração de um conjunto de docentes da CPBS, nomeadamente: Ricardo Gonçalves e Vasco Rodrigues (autores); Filipa Mota, Mariana Cunha, Rafael Dias e Sandra Coelho (colaboradores).

O estudo analisa o funcionamento, a independência e a politização das entidades reguladoras no desempenho de funções essenciais delegadas pelo Estado, nomeadamente a supervisão de setores económicos como a energia e as comunicações, e a garantia da concorrência.

A aprovação da Lei-Quadro das Entidades Reguladoras, em 2013, conduziu efetivamente a uma maior independência das entidades reguladoras portuguesas? Que balanço se pode fazer da criação do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão?  A sua constituição conduziu a um aumento da rapidez, eficiência e qualidade da justiça? Para responder a estas e outras questões, o estudo avalia a independência de três entidades reguladoras – Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), Autoridade da Concorrência (AdC) e Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM) –, analisando, de seguida, o sistema de indicadores de desempenho estabelecido por cada entidade.
O aprofundamento do Estado-Regulador em Portugal parece ter sido sobretudo desencadeado por pressões externas, revela o estudo, motivadas pelas reformas do setor público noutros países ocidentais, pelas obrigações decorrentes da adesão às instituições europeias, e pela necessidade de assegurar credibilidade junto de instituições internacionais como a Troica. Embora a Lei-Quadro das Entidades Reguladoras tenha vindo estabelecer regras que contribuem para uma maior independência da regulação, permanecem diversas restrições a esta independência, relacionadas com a governação e o regime financeiro e organizacional das entidades reguladoras. Esta Lei-Quadro introduziu mudanças que, contudo, não foram tão longe quanto seria desejável no que respeita à proteção da independência das entidades, pois mantém na esfera do Governo competências que deveriam caber à Assembleia da República, permite a aplicação de cativações e limita a realização de atividades necessárias ao exercício de competências sancionatórias.

Nas três entidades reguladoras analisadas no estudo, as reconduções e saídas antecipadas, que podem ser indícios de politização, não são frequentes e não há, em regra, uma disparidade entre a nomeação de políticos e de pessoas não filiadas em partidos. A ERSE é aparentemente a mais politizada das três entidades, uma vez que, desde a sua fundação em 1995, metade das pessoas nomeadas para a administração detinham experiência política, maioritariamente em cargos governativos. A Autoridade da Concorrência é a entidade que tem sofrido o maior impacto das cativações, sendo também aquela em que a politização das nomeações menos se nota.

O estudo evidencia que as entidades reguladoras analisadas monitorizam a sua atividade, utilizando uma grande diversidade de indicadores para a medir. Ao longo do tempo tem havido uma tendência para aumentar o número e variedade dos indicadores usados, sobretudo os que se centram nos resultados da atividade das entidades. São exemplos destes indicadores os relativos à qualidade do serviço prestado pelas empresas reguladas e aos preços praticados.

Sobre o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, criado em 2011, o estudo conclui que contribuiu para o aumento da celeridade nos recursos das decisões das entidades reguladoras, mas tal não se refletiu num aumento da celeridade dos tribunais aos quais esses processos foram retirados. Os dados recolhidos apontam igualmente para um aumento da eficácia da justiça, mas não é possível concluir que tenha existido um aumento da eficiência da justiça. Aliás, a criação de um tribunal centralizado nacional contribuiu para uma justiça mais distante dos cidadãos, implicando um acréscimo nos custos globais – e o aumento da desigualdade – de acesso à justiça.

O estudo observa ainda que a criação deste tribunal não contribuiu para o aumento significativo da especialização dos juízes e que a qualidade da justiça poderia ser melhorada caso fossem alteradas algumas regras vigentes no que toca à seleção de juízes, à assessoria por peritos e ao recurso das decisões. Resumindo, a reforma judicial ficou incompleta: as decisões das entidades reguladoras continuam a ser escrutinadas por tribunais não especializados, como os tribunais administrativos, e não há coerência no que respeita aos recursos judiciais, uma vez que várias entidades reguladoras continuam a permitir recursos para o Supremo Tribunal de Justiça onde, ao contrário de outros países, os juízes não contam com um quadro de assessores especializados.

São estas as principais conclusões do estudo “O Estado-Regulador em Portugal: Evolução e Desempenho”, de acordo com o qual, na última década, o Estado-Regulador em Portugal mudou, mas pouco e nem sempre para melhor, sendo difícil atribuir de forma inequívoca essa escassa mudança à Lei-Quadro das Entidades Reguladoras e ao novo tribunal especializado. 

A sessão de apresentação do estudo decorreu no dia 14 de novembro. Poderá ter acesso ao estudo e à respetiva sessão de apresentação aqui.

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14-11-2022